O que é a positividade tóxica e
como pode afetar a Saúde Mental?
Estar sempre tudo bem, estar sempre feliz, não é normal.
Pode até parecer estranho e mesmo contraditório, mas o excesso de positividade pode ser tóxico:
– Quando impomos a nós mesmos, ou aos outros, uma atitude falsamente positiva;
– Quando generalizamos um estado feliz e otimista seja qual for a situação;
– Quando silenciamos as nossas emoções “negativas/desagradáveis” ou as dos outros.
Podemos considerar que a positividade tóxica é uma corrente de pensamento que influencia as pessoas a valorizarem mais os pensamentos positivos ou as emoções positivas, transmitindo a ideia de que é “mau” sentir emoções negativas e por isso devemos evitar senti-las. O que leva a que as pessoas reprimam essas mesmas emoções negativas, com receio de serem desadequadas por as sentirem, ou seja, sentem-se culpadas por terem tais emoções desvalorizadas e invalidadas pelos outros e pela sociedade em geral.
Ao reprimirmos emoções estamos a contrariar a nossa natureza, estamos de facto a guardar dentro de nós verdadeiras “bombas relógio” que podem explodir em contextos que nada têm a ver com as situações em que as sentimos em primeiro lugar. Quando reprimimos emoções demasiado tempo elas podem manifestar-se de outras formas, podem tornar-se doenças físicas pois acabamos por somatizar (passamos para o corpo) aquilo que não libertamos da mente.
Quando uma emoção negativa é ignorada, não é processada, isso não significa que ela deixa de existir ou que parou de nos afetar. Pelo contrário, se não aceitarmos que as nossas emoções existem e que fazem parte do dia a dia, nunca vamos aprender a lidar com elas.
Todas as emoções têm uma função. Somos humanos e temos um espectro alargado de emoções que vão desde as mais positivas como amor, paz, alegria às mais negativas como raiva, vergonha e medo.
Saber acolher essas emoções, permitirmo-nos senti-las, processá-las, entender porque surgem, qual o seu papel, e por fim libertá-las, expressando-as da melhor maneira, é a forma mais salutar de gerirmos as nossas emoções, seja qual for o seu “calibre”.
A verdade é que há determinadas experiências que são demasiado negativas para vermos um lado positivo nelas e está tudo bem. Não precisamos de estar bem com elas, não precisamos de gostar de as sentir ou gostar que a situação nos tenha acontecido – precisamos apenas de reconhecer que ela aconteceu (e aqui entra a aceitação) e continuar a construção da nossa vida à volta dessa situação, sem a ignorar, mas sem a carregar com o peso que ela poderia ter.
Mas a verdade é que também ninguém nos ensina a lidar com as emoções nem a expressá-las convenientemente, especialmente relativamente às negativas ou mais desagradáveis.
Desde muito pequenos que nos habituamos a ouvir: “Deixa lá!”; “Já passou!”; “Não precisas ficar triste!”; e a minha favorita “Engole já esse choro!”. Para os pais é muito difícil gerir as emoções “grandes” de seres mais pequeninos, quando não sabem nem aprenderam a gerir as suas próprias emoções. Para o adulto é mais fácil travar (muitas vezes porque não aprendeu de outra forma) a emoção da criança na hora, do que a acolher e ajudar a conter, tornando-se co-regulador das emoções do filho até que este aprenda a se auto-regular. Assim, perpetua-se o ciclo de má gestão emocional, pois transmitimos às crianças que ter e sentir emoções negativas e desagradáveis é “mau” e essas emoções devem ser eliminadas. Essas crianças crescem, tornam-se adultos que estão desconectados das suas próprias emoções e que vão ter filhos e o ciclo repete-se novamente. O maior risco para a nossa saúde mental é mesmo esta desconexão com as nossas emoções, é esta desconexão connosco próprios.
Aprender a gerir as emoções de todo o espectro de emoções humanas, acolhendo-as, contendo-as, processando-as e depois libertando-as/expressando-as é fundamental para vivermos bem connosco e com os outros, em família e em sociedade.
Ser optimista e pensar positivo, focando-nos no positivo e nas coisas boas da vida é diferente de tentar “abafar” ou reprimir ou não querer sentir emoções negativas/desagradáveis.
Desta forma, a positividade torna-se tóxica quando em excesso e quando escolhemos ignorar emoções negativas porque não sabemos lidar com elas ou porque achamos que não é suposto senti-las. Para tudo na vida tem de haver um equilíbrio. Por isso vamos ser positivos sim, procurar o lado bom das coisas, mas também vamos permitir-nos viver e experienciar todo o leque de emoções humanas, para que tenhamos a liberdade e a consciência de um dia dizer ” Eu hoje estou triste, mas está tudo bem com isso (reconhecer, aceitar, acolher, expressar). Amanhã é outro dia e terei oportunidade de sentir outras coisas!”